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Estação Campos Altos

Campos Altos | RJ

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Trilhos da chegada
O trem que parte das estações nunca segue caminho sem deixar algo por onde passa. Depois que a locomotiva atravessa os trilhos, a cidade, os funcionários e os moradores sempre se transformam. Em Campos Altos, o povoamento da região e até o nome da cidade foram heranças da ferrovia. A cidade se construiu a partir do leva e traz dos trens que marcou o dia a dia da cidade e de seus moradores. As locomotivas que chegaram como uma promessa de modernidade e desenvolvimento, transformaram completamente a história da cidade e a sua paisagem. Trouxeram pessoas, trabalhadores, máquinas, afetos e boas memórias.

Sejam muito bem-vindos! Me chamo Maria Fontelas e nasci em Portugal, em 1907, mas aos 17 anos, segui os passos do meu pai e vim para o Brasil, chegando em Campos Altos um mês após o meu embarque.

- Maria Fontelas

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Serra do Urubu: mar de morros

A beleza da Serra encantava os viajantes que chegavam à cidade vindos pelo trem de passageiros até o final do século XX. Uma mata típica de cerrado rodeia Campos Altos com suas serras, rios e vales. Árvores de troncos grossos e tortuosos, gramíneas e arbustos. Por ali, também se espalham roças de cana-de-açúcar e de milho, bananeiras, laranjeiras e muitas plantações. Os abacaxis e os coqueiros se destacam de longe e chamam a atenção de quem olha pela janela: um mar de morros, de um sobe e desce constante. Essa bonita – mas também tortuosa – Serra por onde passam os vagões de trem que chegam a Campos Altos é a famosa Serra do Urubu. Suas características dificultavam bastante o acesso da ferrovia à cidade. A importância das produções de Campos Altos e as muitas possibilidades de exploração da região e de conexão com o Oeste Mineiro, porém, fizeram com que uma solução fosse encontrada.

“No mês de abril eu chegava a Campos Altos que surgia com um horizonte visual imenso, magnífico, após a subida íngreme da Serra do Urubu. De Tigre a Campos Altos o trem subia em marcha lenta de maneira a poder se apreciar a paisagem soberba, majestosa, na sua mata virgem à direita e com muitos coqueiros para decorar as margens da estrada. Este cenário era, para uma europeia, de um encantamento incomensurável.”

Relato de Maria Fontelas extraído do livro A Máquina, tração do progresso, de Pablo Luiz de Oliveira.

“Logo ao amanhecer do dia 18, pus-me em observação: vi roças de milho-tambueiras, uma outra com espigas regulares; gado vacum em boa quantidade, mas cavalar insignificante. Abacaxi em grande quantidade, – uma estação tomou-lhe o nome: ‘Abacaxis’. Ainda há muitos ranchos de capim. Cana de açúcar em quantidade, bananeiras bastante! Às 9 e meia horas vi uma fazenda com gado e laranjeiras de fazer inveja!… Na beira da estrada até grande distância vêm-se um capinzal de diversas qualidades, ainda muito verdes.”

Diário de Lembranças do viajante Leopoldo de Miranda, em 1947, ao passar por Campos Altos em um trem de passageiros.

A Garganta da Palestina e a Curva do S

Uma das grandes dificuldades durante a construção da ferrovia foi, sem dúvida, transpor a chamada Garganta da Palestina no encontro entre as serras do Urubu e do Tigre, que contornam Campos Altos. O trecho leva esse nome em homenagem à antiga fazenda da região: a Fazenda Palestina.

A Serra era um obstáculo natural que impossibilitava a chegada das linhas do trem. O peso das máquinas provocava tração nos trilhos que transformava a subida da Serra do Urubu quase impossível. Para que isso fosse possível, foram necessárias inovações diversas na malha ferroviária e no próprio maquinário, como a alteração da bitola do trem e a construção da chamada Curva do S ou Zig Zag. A ideia de fazer diversas curvas no trilho para facilitar esse trajeto foi do engenheiro Pedro Nolasco. Com uma inclinação mais leve, o trem conseguiria subir gradativamente o percurso. Eram várias curvas em formato de ferraduras, com o aclive máximo de 2%. Contudo, apenas a curva S não foi o bastante. Foi preciso construir um túnel que permitisse a passagem dos trens.

Serras adentro: a construção do túnel

“A gente embarcava aqui em Campos Altos e já começava a paisagem. Ia até Uruburetama, depois descia o Tigre. Tinha o rio beirando a ferrovia. Umas paisagens lindas! As águas descendo, formando umas cachoeirinhas. E você não faz ideia de como eram boas as viagens na ferrovia. Todo mundo queria ficar na janela para ver as paisagens.”

Depoimento cedido por Laureci Olímpio de Oliveira, agente de estação.

O trecho ferroviário entre as serras do Urubu e do Tigre tem aproximadamente 570 quilômetros. Por ter sido construído em curvas nos desníveis das serras, à medida que a locomotiva passa, é possível ver vagões em diferentes níveis, além de belas paisagens. De um lado da linha passa o rio; do outro, a mata. Relatos afirmam que era possível ver nascentes de água na beirada dos trilhos. As serras, além de serem importantes atrações locais, eram uma das áreas mais difíceis de se trabalhar, tanto pela dificuldade de acesso ao local quanto pela quantidade de mata nativa.

Assim, nasceu o túnel. Com seus 82 metros de extensão, foi planejado de maneira corajosa e se tornou uma construção histórica na cidade. Inicialmente, a ideia de cortar a serra era algo impensável, porém, com os avanços tecnológicos, se tornou realidade. O túnel foi inaugurado em 1º de outubro de 1912 e possibilitou não apenas a passagem das locomotivas, mas também a ligação com o Oeste mineiro. No mesmo dia, foi inaugurado ainda o trecho da linha férrea de Bambuí a Urubu, como era chamada a Estação de Campos Altos à época.

Apesar das potentes transformações que a ferrovia traria para a região, a princípio, nem todos ficaram felizes com sua chegada. O coronel Manoel de Paula Lemos, por exemplo, dono de uma fazenda na região, opôs-se tão fortemente à ferrovia que chegou a ordenar que ateassem fogo no acampamento dos operários responsáveis pela construção do túnel. Diversos trabalhadores morreram no atentado. Depois desse fatídico episódio, o coronel ficou conhecido na região pelo apelido de Urubu, assim como a serra que contorna o povoado. Foi juntando essas referências que o engenheiro Edwin Cleitor, responsável pelo projeto da estação, nomeou-a Estação do Urubu. Em 1918, após a EFOM assumir o trecho, o nome do povoado e da estação foi atualizado, batizado como “Campos Altos”.

Do túnel, a escuridão e a luz

Depois da curva do S, chegava um dos momentos mais esperados da viagem: a passagem pelo túnel. De repente, vinha a escuridão que funcionava quase como um portal. Passado o escuro, surgiam então o clarão da cidade e uma nova paisagem, acompanhados da expectativa dos breves encontros e despedidas que aguardavam os passageiros na Estação Ferroviária de Campos Altos.

“O túnel também era algo que toda criança que passava ali ficava fascinada, né? Porque escurecia tudo. O momento mais esperado da viagem era a hora que ia passar no túnel.”

Depoimento cedido por Denise Gaia, antiga moradora de Campos Altos.

 

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