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O que vinha com o trem
A ferrovia desempenhava um papel vital em Campos Altos, sendo a principal via de chegada de mercadorias para a cidade. Todos os dias, trens descarregavam produtos essenciais que abasteciam o comércio local. A movimentação constante de cargas na estação era um espetáculo esperado, simbolizando progresso e conexão com outras regiões.

“Você já imaginou as paisagens que a gente via ao longo da linha daqui até Brasília? Daqui até Uberaba? Era muito bonito, viu?”

Depoimento cedido por Laurici Olímpio de Oliveira, agente de estação aposentado.

Tipos de trens e vagões

A locomotiva vinha passando pelos trilhos com seus mais diferentes tipos de funcionamento e modelos de vagões. Conheça alguns dos tipos de trens dos tempos de funcionamento da Estação, em especial aqueles que mais ficaram guardados nas memórias dos campos-altenses.

Maria-fumaça: Locomotiva feita de ferro e geralmente pintada na cor preta. Sua chegada era anunciada por um apito forte. Para que a locomotiva se movesse, era preciso ter carvão, lenha e fogo, materiais usados no aquecimento da água. Quando a água esquentava, ela produzia o vapor, que era usado como combustível. Eram necessárias ainda paradas periódicas para o abastecimento de água.

Trem Noturno ou Mineirão: Conhecido por ser bastante sofisticado, sua chegada causava alvoroço na cidade. Junto dele vinha o cheiro de comida mineira, já que contava com um vagão-restaurante. Além disso, este meio de transporte era destinado a passageiros, portanto, tinha bancos confortáveis e acolchoados, inclusive, uma sessão de dormitório com camas. A parte do dormitório contava com cabines e cortinas que davam mais privacidade aos passageiros. Havia leitos superiores e inferiores, que se assemelhavam a beliches.

Trem misto: Transportava passageiros e cargas em vagões separados. Era considerado um meio de transporte mais simples, com bancos grandes, com até 4 lugares, porém todos de madeira. Os vagões iam abarrotados de passageiros, muitos deles em pé.

Vagão de pagamento: Vagão responsável por transportar o dinheiro usado para pagar os salários dos funcionários da estação. Ele passava por Campos Altos uma vez por mês e geralmente ficava alguns dias na cidade. Logo quando chegava, os ferroviários faziam fila para receber. Além disso, por carregar grande quantidade de dinheiro, ele era feito de um material bem resistente, assemelhando-se aos carros-fortes atuais.

Vagão-restaurante: O vagão ficava entre a primeira e a segunda classes do Noturno e nenhum passageiro podia embarcar trazendo alimentos de casa. Dentro do vagão, existiam mesinhas para as pessoas se sentarem e se alimentarem. Suas janelas eram cobertas por cortinas brancas que proporcionavam a privacidade dos passageiros, servidos por garçons. No cardápio, pratos típicos da comida mineira, como feijão tropeiro, acompanhado de arroz, bife e salada. Além disso, eram vendidos produtos importados, como maçãs, vinhos e cervejas. Entre as paradas do Noturno, os moradores muitas vezes aguardavam no pátio da Estação para comprar itens do vagão-restaurante que passava.

Vagão de hanseníase: A hanseníase, popularmente conhecida como “lepra”, foi uma doença que assolou a região por muitos anos e, pela falta de informação e de recursos, provocou o isolamento de milhares de pessoas acometidas por ela. Por volta de 1970, o aumento de casos da doença assustou diversos moradores, não só de Campos Altos, mas de todo o país. Pelo fácil contágio, por gotículas, e devido à gravidade da doença, os enfermos eram transportados em um vagão separado. Ele era cinza e passava com frequência extracotidiana. O chefe da estação também alertava toda a cidade com antecedência a respeito da chegada eminente do vagão. Assim que chegava, ficava um segurança na estação, para não permitir a entrada das pessoas com a doença na cidade. Segundo alguns relatos, no dia em que esse vagão passava, os moradores ficavam em suas casas pelo medo da transmissão da doença.

“Quando vinha transporte de hansenianos, eu acho que vinha de Araxá, de Ibiá e talvez de Uberaba, eu não sei de onde vinha. Tinha um militar numa porta do vagão, outro militar na outra porta do vagão, pra garantir a permanência desse povo lá, porque, senão, esse povo fugia. E fugia com razão. Estavam deixando mulher, filhos, não se entendia bem o caso da doença, não é? E ficavam fechados lá em Bambuí. Quantos anos que as pessoas iam ter que ficar lá longe da família. […] Meu pai, que era chefe da Estação, avisava pra nós não ficarmos na plataforma, tínhamos que sair ou ficava fechado dentro de casa ou tinha que ir pra longe. E avisava todo mundo que estava lá, tinha que avisar. Com antecedência, ele recebia o comunicado que aquele trem, que aquela composição, estava carregando os hansenianos. Era triste.”

Depoimento cedido por Miguel Célio Patto Ramalho, filho de agente de estação aposentado.

Para chegar em Campos Altos, só de trem!

Antes da chegada da estrada rodoviária, tudo o que era necessário para a cidade vinha pelos trilhos. Alimentos, gados, minérios, materiais de construção, mudanças, encomendas, correios e até mesmo os filmes para o cinema vinham em um vagão específico. Além do transporte de materiais, o trem transportou passageiros, até a década de 1980. Chegavam visitantes para aproveitar a ativa vida cultural da cidade, comerciantes, fazendeiros e mão de obra para trabalhar nas colheitas e nas ensacas de café.

“Toda mercadoria chegava de fora… arroz, feijão. Tudo descia aqui.”

Depoimento cedido por Sinval Cordeiro, morador de Campos Altos.

Café achado é café vendido

Durante o ensaque do café, ou mesmo durante seu transporte, era bem comum que algumas das sacas rasgassem. Assim como o era que os vendedores fizessem furos nos sacos para colher alguns grãos e checar a qualidade deles. Os grãos costumavam ficar espalhados pela plataforma da estação e muitas crianças e jovens os catavam para vendê-los nos armazéns. Essa forma de trabalho foi bastante usada pela juventude de Campos Altos para pagar ingressos de cinema ou até para ter uma renda extra e ajudar a família em casa.

“Os vagões paravam ali para descarregar os cafés, então minha lembrança de criança é que eu esperava, porque era quando os vagões chegavam lá pra descarregar os cafés, e caía. Às vezes, algum saco furava, e a gente ia recolher aqueles cafés em grão do chão, pra gente vender. Na época, era um preço muito bom. Eu comecei ali o meu desenvolvimento de vendedor, assim, um pouco, foi pegando esse café lá, recolhendo esse café, pra vender nos armazéns.”

Depoimento cedido por Jarbas Ribeiro de Carvalho, dono do Jornal de Campos Altos.

Trem que leva café e traz trabalhador pra colheita

Para as colheitas, era preciso uma mão de obra maior do que a que se tinha disponível na cidade. Assim, trabalhadores vinham de diversas partes do país, mas principalmente da região Nordeste do Brasil. Eles chegavam de trem e ficavam hospedados em pensões durante o período da safra. Era um trabalho muito árduo e em condições difíceis. A força motriz para a grande ascensão do café foi esses trabalhadores, responsáveis não somente pela colheita, mas também pelo ensaque, pela distribuição, pela separação do café e pelo carregamento final das cargas. Infelizmente, há também relatos de trabalho infantil nesse período, durante a década de 1960.

“Casca de café queimado, que era as máquinas de café… eram movidas com aqueles locomóveis (tipo de caldeira para torra de café). Então, nessa época, por exemplo, ficava aquele cheiro no ar de casca de café queimado, que é muito bom. Então, até hoje, quando eu sinto esse cheiro, eu volto naquele tempo.”

Depoimento cedido por Fábio Falco, morador antigo da cidade de Campos Altos.

Encomendas e carroceiros

O trem de passageiros tinha um vagão que era dividido entre o uso do chefe-fiscal e do guarda-freio do trem e entre o uso para transporte de pequenos volumes, encomendados por moradores e comerciantes locais, como panelas, cereais e até cabichos de banana. Por ali, era transportado de tudo. Como não existiam caminhões na cidade, o transporte, desde o armazém que recebia as encomendas até o dono do pedido, era feito por carroceiros. Na década de 1940, havia três carroceiros muito conhecidos. Um deles chegou a ser apelidado de “Plínio Carroceiro”. O pagamento dos fretes acontecia de duas formas: algumas mercadorias já vinham com o frete pago e outras recebiam o pagamento no momento da entrega.

“Antes de eu vir pra estação de Campos Altos, não existia horário pra buscar as encomendas que vinham no trem. Então, o pessoal queria buscar a qualquer hora, e tinha um homem aqui que se chamava João Vianna, que era conhecido por ser muito bravo. Ele foi na estação tirar a encomenda, mas já estava escurecendo, então falei pra ele: ‘Não, volta amanhã às 8 horas da manhã.’ E um guarda-chaves que viu ele indo embora falou assim pra mim: ‘Esse homem é o homem mais bravo aqui de Campos Altos.’ Respondi pra ele: ‘É, mas horário é horário, né?’”

Depoimento cedido por Antônio Lopes, mestre de linha aposentado.

Manteiga fresquinha

Um dos importantes produtos escoados pela ferrovia partindo de Campos Altos foi a manteiga. Durante o início da urbanização da cidade de Campos Altos, a fábrica de manteiga “Estrela d’Alva” foi marcante. A ferrovia desempenhou um papel de extrema importância para o desenvolvimento da fábrica, uma vez que toda a produção era escoada para o Rio de Janeiro pelos trilhos do trem. A construção de um conjunto habitacional para os trabalhadores da fábrica fez parte do progresso urbano da cidade e muitos dos operários acabaram por migrar de forma permanente para a região.

Histórias e afetos

Para além de pessoas e mercadorias, os trens traziam e levavam centenas de histórias, afetos e memórias. Reunimos algumas das que colhemos por aqui.

Viajante Chico Cego

“Eu sempre ouvia aqui em Campos Altos a história do Francisco Chico Júlio, que ficou conhecido na cidade como “Chico Cego”. Era um viajante que saía todos os dias de Campos Altos, em direção a Uruburetama. Ele sabia direitinho a hora que o trem passava. Todos os dias, pontualmente às 5 horas da tarde, chegava à Estação. Usava uma bengala como guia, entrava no vagão e ia direto para o lugar em que sempre se sentava. Dizem que ele andava de vagão em vagão pedindo esmola e gritando: “Um tostão, um tostão.” Chico contava casos por horas a fio, e todos ficavam encantados com essas histórias. Chegavam a pedir que ele ficasse por Campos Altos, mas ele sempre se negava. Dizia que seu lugar era em Uruburetama. Chico faleceu pelas redondezas do trem que tanto amava. Infelizmente, quando ele estava mais idoso, ao atravessar o túnel, foi picado por uma cascavel e não resistiu.”

História cedida por Jair Pereira, morador de Campos Altos.

Ladrões de comida

“Entrei para a rede ferroviária de Campos Altos no ano de 1976. Nessa época, existia um ferroviário que era ótimo cozinheiro e todos os dias fazia marmitas para os funcionários da estação. A comida era deliciosa. Tinha sopa, feijão, mingau e muitas outras delícias mineiras. Todos comiam e ficavam satisfeitos. Certa feita, o cozinheiro começou a estranhar o sumiço de muitos alimentos. Era queijo que sumia. Banana que ele jurava que estava em cima da mesa e não achava por nada. Milho de repente desaparecendo do saco. Começaram a investigar o sumiço dos alimentos, quando pegaram os ladrões no flagra: era uma quadrilha de ratos! Os bichinhos estavam roubando todos os alimentos que seriam para o preparo das marmitas dos trabalhadores. Eu sem saber bem o que fazer nessa situação, liguei para o engenheiro residente para pedir ajuda, mas ele foi curto e direto: “Arranjem umas caixas e fechem essa comida ou tratem de adotar alguns gatos.”

História cedida por Antônio Lopes, mestre de linha aposentado.

Cobra esculpida

“Fui funcionário da estação ferroviária entre 1975 e 1996. Durante o período de trabalho, precisei fazer um pontilhamento em um dormente, mas estava com uma dor de barriga muito forte. Então, na hora do almoço, resolvi sair procurando um remédio. Enquanto fazia isso, me distraí do incômodo e encontrei uma rocha grande, de quase 30 metros de altura. Subi e vi um passarinho verde muito bonito, então decidi seguir ele para tentar encontrar o ninho com os filhotes. Como estava prestando atenção no passarinho, não percebi que tinha uma cobra se aproximando de mim. Quando vi a cobra, ela já estava pronta para dar o bote. Foi na minha direção e enroscou nas minhas pernas. Fiquei com tanto medo de ser picado que comecei a sapatear. Sapateei e, depois, caí dos 30 metros de altura, ficando na linha em pé. Assim que voltei para casa, passei a noite esculpindo a cobra em um pedaço de madeira. Até hoje, mostro a cobra esculpida como prova do que aconteceu.”

História cedida por José Sebastião, maquinista aposentado.

Criança malcriada não ganha maçã

Uma das grandes atrações do vagão-restaurante estava nas maçãs. Na cidade, quase nunca se via a fruta, importada de países europeus, mas ela era comercializada na ferrovia. Nas paradas do trem, os moradores saíam de suas casas para comprá-las pelas janelas da locomotiva. E era uma correria danada. Provar uma maçã em Campos Altos no início do século 1920 era algo tão desejado que muitos pais usavam isso como forma de premiação e punição com suas crianças: quem fizesse bagunça no dia em que o vagão com as maçãs passava ficava sem a fruta.

História cedida por Denise Gaia, moradora de Campos Altos.

Galinha sorteada

Ao redor da estação, tinha um vendedor de galinhas muito conhecido por todos. Ele vendia os animais para quem estava de partida entre as paradas do trem. A venda acontecia da seguinte forma: pela janela, o viajante estendia o dinheiro e, em troca, recebia a galinha escolhida. Mas o vendedor por várias vezes, achando-se muito esperto, aproveitava que o tempo era curto e, dentre as galinhas, entregava a mais magrinha. E o viajante partia insatisfeito, deixando a galinha escolhida para trás.

História cedida por Jair Pereira, morador de Campos Altos.

O dia em que salvei meus companheiros

“Na época em que eu era feitor, fui chamado para desentupir um bueiro no túnel, que estava inundado. Foi minha turma e eu. Chegando lá, perguntei para o mestre de linha como iríamos fazer para entrar, já que o lugar estava alagado. Ele falou pra gente entrar abaixados em fileira. Eu disse que não ia fazer isso. Ele era meu superior, mas me recusei, porque não queria colocar meus companheiros em risco. Então ele chamou o engenheiro, e ficaram conversando por uns minutos. Depois, o engenheiro-chefe veio até mim e me parabenizou por eu ter me recusado a entrar. Porque evitei que um acidente sério acontecesse com os meus colegas. Para resolver o problema do alagamento, dei a ideia de construírem um bueiro na galeria do dormente, de maneira que a água pudesse escoar. E ele está lá até hoje!”

História cedida por Antônio Lopes, mestre de linha aposentado.

Marmitas pela janela

“Quando tinha por volta de dez anos, eu levava todos os dias a marmita do almoço para o meu pai na Estação. Ele era agente. Minha mãe fazia o almoço, separava primeiro a comida do meu pai e de meus irmãos, e depois a gente almoçava. A gente morava bem próximo à estação. Eu andava dois quarteirões e entregava pela janela da estação a marmita quentinha para ele. Várias outras crianças também faziam o mesmo. Às vezes, quando meu pai tinha mais tempo, eu ficava com ele na estação. Gostava de vê-lo com os seus companheiros de ferrovia. Era curiosa a forma como se reuniam para comer e conversar. Lembro que eles sempre estavam rindo e se tratavam com muito respeito, era bonito de ver.”

História cedida por Carlos Roberto de Morais, filho de antigo agente de estação.

O dia em que conheci o presidente

“Me lembro que, quando eu era maquinista lá em Caeté, na década de 80, passou por ali um trem de passageiros especial. Nele estavam o superintendente da rede ferroviária da época, que se chamava Júlio Figueiredo Coutinho, e o Presidente da República vigente, João Batista de Figueiredo. Nesse dia, toda a Estação se preparou para receber o presidente. Ficou um guarda-chaves na entrada e outro na saída aguardando. Na época, utilizávamos o sistema de sinalização e licenciamento por bandeiras. Me lembro como se fosse ontem do chefe de estação com a licença, todo alinhado, esperando para me entregar a licença no momento da passagem do trem. Então sempre conto que, por causa do meu trabalho na ferrovia, eu até já conheci presidente!”

História cedida por William da Paixão, maquinista aposentado.

O cozinheiro de 5 minutos

Havia no alojamento da ferrovia um cozinheiro famoso por ser um “velocista” nos preparos das refeições. Se, por algum motivo, a entrega da comida atrasasse, ele era chamado imediatamente. Pegava uma panela de pressão, adicionava frango, arroz, sal e batata, deixava cozinhar por 5 minutos, e as marmitas estavam prontas. É claro que, com tanta rapidez, algum descuido acontecia às vezes, e até embalagens eram encontradas nas refeições. Por isso, conta-se que muitos ferroviários esperavam estar bastante famintos para poder comer as marmitas sem se importar tanto com o gosto!

História cedida por André Luíz da Silva, maquinista aposentado.

O clarinete maior que o menino

“Quando eu era criança, sofria muito com bronquite, então me chamaram para participar da banda da cidade. Pensavam que se eu tocasse um instrumento isso ajudaria. Entre os instrumentos que tinham, escolhi o clarinete e, a partir dos 12 anos, comecei a aprender e tocar com as outras crianças. Nosso grupo tinha mais ou menos uns dez meninos e meninas naquela época. Um dos dias mais marcantes dessa história foi quando tocamos em frente à estação ferroviária, na inauguração da Cemig na cidade. Me lembro que até o governador do estado estava lá. Ele apontou para mim durante a apresentação e falou: “Como pode um molequinho daquele tamanho custando a carregar o clarinete, mas tocando tão bem.”

História cedida por Carlos Roberto de Morais, filho de antigo agente de estação.

Parto, casamento, trabalho ou festa: seja o que for, vai ter que esperar o trem passar

“Me lembro que, quando acontecia algum problema, e o trem ficava parado nos trilhos, demoravam muito para consertar. A gente esperava de 40 minutos a 1 hora para atravessar, e essa era a única opção que tínhamos, já que não existia o viaduto nem a passarela. Certa vez, o trem ficou parado durante dias. Na época, houve partos que aconteceram sem assistência, casamentos e compromissos diversos que precisaram ser adiados. Eu, por exemplo, quase perdi meu alistamento justamente por causa dessas demoras. Já tinha marcado a hora da celebração, mas não conseguia passar porque, devido à chuva, o trem precisou parar por um longo período ali no trecho. Eu estava até arrumado para receber o meu título e certificado de reservista. O evento era no Clube, do outro lado, há apenas dez metros, mas eu não conseguia passar de forma segura.”

História cedida por Carlos Roberto de Morais, filho de antigo agente de estação.

De grão em grão se compra ingresso

“Na minha infância, eu me juntava com outros meninos para catar o café que caía no chão da Estação. Os caminhões levavam café para encher os vagões de carga da Rede, e, na hora que iam descarregar, existia uma pessoa responsável por furar os sacos e verificar a qualidade do café. Assim, era confirmado se o café que estava embarcando era o mesmo encomendado pelo comprador. Para não ter problema com a troca dos sacos, quem verificava isso era chamado de furador. Como todos os descarregamentos de café aconteciam na mesma hora, ele ia furando e jogando o café pelo chão. Além disso, às vezes, um saco rasgava bem na hora que estava sendo descarregado. Então, eu e meus amigos catávamos aquele café no chão, colocávamos em um saco de papel e vendíamos no armazém do Seu Arlindo. Esse armazém ficava no mesmo local onde hoje é o Clube Social, então, por causa dessas vendas, sempre tínhamos algum dinheirinho no bolso e aproveitávamos esses trocados para ir ao cinema na matinê.”

História cedida por Miguel Célio Patto Ramalho, filho de antigo agente de estação.

Capivara

“Às vezes, aconteciam algumas brigas durante as viagens de trem, porque os chefes de estação bebiam um pouco e, na hora de conversarem com os passageiros, arrumavam encrenca. Me lembro que uma vez estávamos em Uberaba, o nome da estação era Capivara, e, na hora de pedir a passagem, o chefe só bateu na mesa e gritou: “Capivara”. Tinha um casal na mesa, e o homem pensou que ele estava xingando a mulher dele de capivara. Na hora, ele começou a brigar com o chefe, e foi uma confusão. Então, essas coisas aconteciam às vezes, por isso a gente viajava sempre rindo.”

História cedida por Antônio Lopes, mestre de linha aposentado.

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